Eu suponho o céu

No meio de uma risada e outra, ele disse, de repente: você supõe o céu. Uma das frases mais carregadas de losermanianismos existentes na face da Terra! E logo ele, o que nunca abria o coração, o que guardava extratos bancários como se fossem cartas e jogava meus bilhetes cheios de amor no lixo como se fossem ... lixo.

Eu já não reconhecia o olhar, não consegui digerir tamanha mansidão e amor numa frase só. Não parecia algo típico dele dizer, soaria mais natural se fosse eu, em meio de algum de meus devaneios, cantarolar essa parte da música ao pé do ouvido dele. Mas não, foi ele quem disse, com todas as treze letras e três acentos.

Enquanto eu me engasgava, parei pra pensar no que a frase significava. Você supõe o céu: É lindo, é doce. É o mesmo que gritar para o centro da cidade todo ouvir que você, só você, trás o azul pra perto, ou que você é um pedaço de nuvem aqui no meio de tanta gente sem graça.

Eu fiquei sem reação. 

Juro que pensei em fugir. Era o menos certo a se fazer, mas, era algo a se fazer. Ele viu minha inquietação e me olhou com aquele olhar que não tem significado, mas que no fundo você sabe o que significa.

Sabe, eu sempre vi meus bilhetes jogados no lixo como se fossem um buquê das flores que ele disse que pareciam comigo. Sempre achei lindo ele guardar os extratos bancários, principalmente depois de descobrir meu nome rabiscado e um coração ao lado, no verso de um desses. Eu vi no fundo daquele olhar que talvez, eu realmente seja um pedaço do céu.

Um pedaço de céu inconstante, que esbanja trovões e raios, mas logo depois se derrete em um arco-íris; Um pedaço do céu que carregou o vento que entortou a flor, assim como diz a canção. Eu suponho o seu, eu suponho o céu.

Isabela Lacerda